aqui na lua
terça-feira, novembro 25, 2003
  Natal
"Todos os dias são dias de Natal"

Não é verdade.

Todos os dias são bons dias para se reflectir e practicar a solidariedade.

O Natal há muito que deixou de ser isso para mim e para a minha família. Não é cristão nem religioso. É uma tradição, uma festa tradicional que todos os anos respeitamos com o rigor de quem é fiel à sua cultura e se esforça por mantê-la viva na memória dos que estão a chegar todos os anos.

É fase de reprodução na minha famí­lia. A minha geração está a parir anualmente e a nova geração já se compara em número à anterior e aumenta a olhos visto aos dois de cada vez em alguns casos.

Por isso, todos os anos por esta altura começam as excursões de carro às tantas da noite, demasiado tarde para os olhitos cansados que brilham no banco de trás no fim de um longo dia de aventuras e descobertas, às ruas antigas e mais comerciais de Lisboa.

Por esta altura também, fazemos greve aos centros comerciais já pouco frequentados em off-season, tirando umas idas tardias ao hipermercado quando até o leite começa a faltar em casa.

Dentro de poucos dias abre-se a primeira janela do calendário de Natal criteriosamente escolhido pelas mãozinhas inspeccionadoras e exigentes dos mais pequenos. Fazem-se enfeites de Natal e recuperam-se os antigos das caixas arrumadas há pouco menos de um ano na prateleira de cima do armário. Decora-se a àrvore de Natal. Compra-se barro para fazer o novo presépio e percorre-se a Serra de Sintra entre bosques em busca de musgo bom para o ostentar. Sempre a pé porque os animais não gostam de carros e não se pode perder a oportunidade de ver pela primeira vez o lobo que nunca apareceu.
Percorrem-se os caminhos gastronómicos da confecção de doces de abóbora, marmelo, maçã e laranja. Do pão da avó Benvinda e das broas cuja receita secreta se mantêm na família há muitas gerações. Cuscurões, sonhos, filhós, rabanadas, chás de ervas e muita erva doce.

A parte mais importante do Natal é mesmo o mês que o antecede.

A véspera e o dia de Natal na minha famí­lia conjugam uma série de factores que fazem desta família um exemplo perfeito dos tempos modernos. A véspera em casa da avó materna, depois para casa da avó paterna e acaba na casa dos pais do padrasto, para no dia seguinte a excursão passar pelos avós de ambos os lados e terminar numa montanha de presente amontoados à porta de minha casa onde vivemos como família nuclear.
Os meus filhos têm muitas famí­lias. As minhas, as dos pais, as dos pais dos irmãos, as das mães dos outros irmãos, as dos padrastos, as das madrastas e todas as que se foram separando e dividindo ao logo dos tempos. Por isso, de alguma maneira, a tradição do Natal une-me a eles mais do que o Natal própriamente dito.

Não é um Inferno, sabemos vivê-lo bem. Mas todo o mês que o antecede é a razão da sua existência para nós. Estamos mais próximos uns dos outros porque fazemos coisas juntos e passamos mais tempo uns com os outros.
Como antigamente, sem pressas porque cada coisa demora o seu tempo e merece respeito e dedicação. E esse tempo é importante viver, saborear e partilhar.

Por isso o Natal moderno e vazio de que toda a gente fala fica fora das nossas almas ocupadas com as coisas quentes e antigas da nossa história convictas da importância de cada gesto, de cada ingrediente e de cada significado.

Bom Dezembro a todos!
 
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