aqui na lua
quinta-feira, junho 17, 2004
  Ternura


Desvio dos teus ombros o lençol

que é feito de ternura amarrotada,

da frescura que vem depois do Sol,

quando depois do Sol não vem mais nada...



Olho a roupa no chão: que tempestade!

há restos de ternura pelo meio,

como vultos perdidos na cidade

em que uma tempestade sobreveio...



Começas a vestir-te, lentamente,

e é ternura também que vou vestindo,

para enfrentar lá fora aquela gente

que da nossa ternura anda sorrindo...



Mas ninguém sonha a pressa com que nós

a despimos assim que estamos sós!

David Mourão-Ferreira



 
terça-feira, junho 15, 2004
  Salpicos de revolta



"Quando um homem da floresta
Passando vê uma flor,
Não apanha a flor com a mão.
Pára, e depois seguindo,
Leva a flor no pensamento
e o aroma no coração."

Lembrei-me disto a propósito de uma discussão acesa que tive hoje por telefone... há pessoas que vivem em absoluto estado de direito e que vivem e respiram como se tudo lhes pertencesse e não tivesse direito à existência senão para lhes agradar ou servir.
O pior é que são demagogos o suficiente para disfarçar as suas verdadeiras intenções com justificações espiritualistas do género: "eu não uso por querer, sou obrigado a isso porque a sociedade não gosta de mim e tenho muito azar em tudo o que faço e todos estão melhor que eu mas eles é que têm problemas. Por isso eu sou uma alma superior que evoluiu com sofrimento e sei mais através da minha experiência do que o mundo inteiro e por essa razão toda a gente me devia prestar vassalagem e ficar contente porque eu existo e faço bem a quem me rodeia. E se não faço é porque as pessoas não o querem sentir"

Há paciência????? Mas que merda é esta????? Esta geração pós 25 de Abril (à qual pertenço) anda com os cornos ao contrário! Que raio de valores nos tentaram impingir que não os vejo? Onde está a liberdade de cada um? Onde está o respeito ao próximo? Onde estão os compromissos de cidadania? É esta merda a auto-determinação?????? Eu faço o que me apetecer porque não tenho de assumir responsabilidades pelos meus actos? Porque as consequências não são minhas são o curso natural das coisas? Porque não tinha intenção??????

O mais fácil seria alienar a nossa vida, abrir falência e colocar os problemas em hasta pública. Ou, como diriam antigamente: meter a cabeça debaixo da terra e bater as asas com força para assustar os dragões.

Cada vez me parece mais que andei anos a lutar por coisas ao lado de pessoas que lutam por abstrações e que o fazem por moda, com a convicção de quem não precisa de pensar muito porque já muita gente pensou por elas o que concerteza lhes dá razão. É ou não é?

É ou não é que exploramos os outros nas coisas mais simples e que a vergonha não nos mata? É ou não é que a exploração é feita a vários níveis: trabalho, casa, filhos? É ou não é que desde que há divórcios o número de mães solteiras a sustentar os filhos sózinhas tem vindo a aumentar anualmente de uma forma absurda? Há alguém que me mande uma estatística exacta deste fenómeno? É que estas mães matam-se a trabalhar para poderem igualar os colegas de trabalho e sacrificam uma relação saudável construída através da presença na educação dos filhos para que os benditos senhores possam preservar os seus direitos, a sua liberdade e a sua auto-determinação!!!!!!

Não há nenhum julgamento final? É que esta cena de ser ateia não me dá consolo nenhum! A lei não protege eficazmente estas mulheres e ainda por cima não há um Deus para castigar o malfeitores e puni-los ferozmente!

Resta-me o consolo de saber que tudo passa: "Nada se cria, nada se perde, tudo se transforma". E o desconsolo de saber que este é também o consolo dos outros.


 
sexta-feira, junho 11, 2004
  Testes
Bom... digam o que disserem, gosto sempre do resultado dos meus testes:






Faça você também Que
gênio-louco é você?
Uma criação de O Mundo Insano da Abyssinia





É ou não é genial???
 
terça-feira, junho 08, 2004
  Trânsito de Vénus
 
  Infância


Acontece-me de vez em quando esta nostalgia de ausência nem sei do quê... Como se algo me esperasse ali à frente e estivesse apenas à espera da minha descoberta.
Serei eu cega? Surda ou muda?
Este caminho que percorro ter-me-á sido destinado ou é apenas um dos muitos que se me apresentou e que eu, inconscientemente ou não, escolhi? O vazio e a solidão andam de mão dada nos dias que passam preenchidos por tantos nadas e ponteados por aquilo a que aprendi a chamar vida sem sequer compreender a verdadeira amplitude de tal fenómeno.
As músicas da minha banda sonora, das vidas que gerei, dos espaços que construí, as imagens de um filme mudo onde as vozes se perdem ao som de baladas, canções, sinfonias, concertos, cantatas, missas que não me saem da cabeça e discorrem quase sem parar, quase sem silêncios. E sigo em frente, ao som de tudo isto, embalada pela bebedeira desta tal forma de existência a que alguém chamou vida. Vadia.
Existências pequeninas, cheias de sentido, efémeras e, a maior parte das vezes, condenadas a serem obsoletas... borboletas sem efeito.
Quando era miuda, bem miuda, escrevi um texto pequeno num dos caderninhos que me fui habituando a coleccionar e que ainda hoje guardo e construo, cheios de papéis, bilhetes, fotografias, flores, etc... Esse texto falava de um sonho que se repetiu durante anos até me ter abandonado definitivamente: estava presa pelas pernas no vazio e uma colina à minha frente escondia uma luz que perdia a força lentamente, eu debatia-me para me soltar sem saber o que me prendia enquando a luz enfraquecia. Nunca consegui soltar-me. Acho que este sentimento é um dos tijolos da minha vida e é por isso que esta nostalgia não me abandona. E basta um cheiro, um soprar de brisa ou uma imagem para despertar este estado de alma e me encher de infância outra vez.

 
segunda-feira, junho 07, 2004
  Não ames muitas vezes, mas ama para sempre


"Não ames muitas vezes, mas ama para sempre. Era um dos lemas da minha mãe e ao longo de toda a minha vida tem sido a história do meu coração. Antes de vir para a abadia, julgava que tinha percebido. O amor pela minha mãe; o amor pelos meus amigos; o amor obscuro e complexo de uma uma mulher por um homem. Mas quando Fleur nasceu, tudo mudou. Um homem que nunca viu o mar pode pensar que compreende o mar, mas projecta apenas aquilo que sabe; imagina uma imensa massa de água, maior do que uma represa de moinho, maior do que um lago. A realidade, porém, transcende a imaginação: os odores, os sons, a angústia e o júbilo excedem qualquer comparação com experiências anteriores. Foi o que se que se passou com Fleur. Jamais, desde o meu décimo terceiro Verão, tinha havido um despertar assim. Desde o primeiro instante, quando Mére Marie ma levou para lhe dar de mamar, eu soube que o mundo tinha mudado. Tinha estado sozinha sem o saber; tinha viajado, lutado, sofrido, dançado, fornicado, amado, odiado, ofendido e triunfado completamente só, vivendo o dia-a-dia como um animal, sem me preocupar com nada, sem desejar nada, sem recear nada. E de súbito, tudo era diferente: Fleur viera ao mundo. Eu era mãe."

in Na Corda Bamba
Joanne Harris
 
Cronicas de uma nova colonia. Comentarios: aquinalua@gmail.com

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