aqui na lua
terça-feira, março 01, 2005
  Planeamento Familiar
"Direito da família decidir em liberdade, quando e quantos filhos desejam"
Constituição da República. artº 67º, al. d



"- Generalização da educação sexual nos estabelecimentos de ensino.
- Criação de condições que possibilitem a divulgação e o acesso das mulheres aos meios anti-concepcionais e inclusão do receituário contraceptivo no esquema da assistência medicamentosa das instituições de previdência.
- Abolição da legislação repressiva em relação ao aborto, que deve ser encarado como último recurso face a uma gravidez não desejada.
- Divulgação nos meios de comunicação social e outros, dos perigos que o aborto acarreta para a saúde e para a mulher.
- Reconhecimento à mulher do direito ao aborto gratuito, até ao máximo do 3º mês da gestação, em boas condições clínicas e higiénicas, de modo a eliminar-se a especulação comercial do aborto clandestino e a evitar-se a elevada mortalidade materna provocada pela maioria das condições em que estes se fazem."

in Carta Dos Direitos Da Mulher
Movimento Democrático de Mulheres Portuguesas (MDM)
Julho de 1977


Descobri este documento entre os papéis que a minha mãe guardou e que anda a vasculhar na derradeira tentativa de pôr ordem da casa. Achei piada porque no contexto actual deste assunto, ao fim de 30 anos, a luta ainda é a mesma. Não está vestida a rigor revolucionário nem é entoada a várias vozes em manifestações de rua. É gritada em segredo pelas (ainda tantas) mulheres que enchem a prisão de Tires (e outras) e os tribunais acusadas, muitas vezes, pela própria família, companheiros, etc... e pelas que, como eu, tiveram e arriscaram trazer ao mundo 3 crianças e conhecem as dificuldades e impossibilidades de levar a cabo tamanha tarefa sem um mínimo de condições que não estão, nem de perto nem de longe, asseguradas pelo Estado. Posto isto, e uma vez que a responsabilidade em relação à vida futura destes seres é quase exclusiva dos progenitores e, em grande parte dos casos, das mães, não seria necessário responsabilizar o Estado pelo sustento ou apoio à família para que este lhes possa impor a decisão ou tomá-la por eles?
Se somarmos às, já de si, enormes despesas de alimentação, vestuário, habitação, etc... a hipótese de se ter um filho com uma doença crónica (não detectável no período de gestação) como asma, diabetes e outras e a necessidade de acompanhamento intensivo por parte dos progenitores (e consequentemente a impossibilidade de cumprir um horário regular de trabalho), o desemprego crescente e todas as perspectivas dramáticas que se podem enumerar hoje em dia, como podemos assegurar uma vida estável e equilibrada às crianças trazidas ao mundo de uma maneira geral e àquelas que vêm em condições precárias em particular? - Cabe aos pais avaliar a situação e decidir de acordo com as suas possibilidades e com a realidade que espera pelo seu filho.
Este discurso não pretende defender o meu ponto de vista (sou a favor da despenalização da interrupção voluntária da gravidez e explicarei melhor adiante porquê) mas colocar algumas questões que considero pertinentes relativamente a este assunto do ponto de vista ético, uma vez que é desta perspectiva que o tema tem sido abordado pelas diversas frentes embora caindo consecutivamente na moralidade da questão. Normalmente os problemas éticos que se colocam prendem-se com o facto de não ser reconhecido a alguém (tanto na questão do aborto como da eutanásia e até da pena de morte) o direito de decidir sobre a vida ou morte de outro ser humano – questão que também se coloca há anos na sequência das guerras do século XX e do serviço militar obrigatório. Outro problema enunciado também relativamente a este assunto é a atitude de decidir irresponsavelmente e, neste aspecto, perdoem-me mas a irresponsabilidade passa pelo próprio Estado a partir do momento em que decide por alguém acerca da vida ou da morte de outro sem assumir as consequências de tal decisão. A partir desse momento o Estado deveria ter condições de assegurar a comodidade, a segurança, a saúde e a educação dessas crianças de forma a torná-las competentes e capazes de enfrentar o mundo, a idade adulta e as responsabilidades da vida em sociedade.
Não chega a quem pouco tem (como apregoam algumas mentalidades beatas) o indispensável que se lhe pode assegurar quando defendemos a sua vinda ao mundo. Não é com aconselhamento, roupas usadas e livros em 5ª mão que se educam os nossos filhos hoje em dia. Hoje em dia há computadores, internet, brinquedos pedagógicos, ocupação de tempos livres, actividades extracurriculares, etc, etc, etc que não são negadas pelas ditas beatas às suas crias mas que são consideradas periféricas e dispensáveis quando se trata das pobres crianças dos outros. Que sentirá uma mãe que não pode dar ao filho aquilo que este precisa? E o que sentirá um filho ao saber que não pode ter o que é normal uma criança da sua idade ter? E pior… o que sentirão uma mãe e um filho que não se desejam ao verem-se obrigados a amar-se? Enfim… não sei. Mas há quem saiba. E se bem que é verdade que na maioria dos casos as mães entregam-se ao amor, a vida que podem proporcionar não é a que desejariam e sofrem por isso e, noutros casos mais graves, entregam-se ao ódio e provocam chagas psicológicas difíceis de tratar.
Estes pontos são argumentos de ordem “semântica”.
O mesmo não acontece com a análise nua e crua da realidade e das consequências da realização de abortos clandestinos sem condições primárias de saúde e higiene e sem um exame adequado ao estado de saúde e potencial de risco para as mulheres que a eles recorrem.
Aqui começa a "pescadinha de rabo na boca": O Estado decide, o Estado não se responsabiliza, os progenitores não podem assegurar, as mulheres fazem abortos clandestinos, as coisas correm mal, as mulheres são condenadas porque o Estado é que decide.

Irei desenvolver este texto e até modificá-lo mas ponho-o já on-line porque sim, porque me apetece. Porque acima de tudo é um desabafo e, como todos os desabafos, corre o risco de acabar por aqui ou demorar uma eternidade.
 
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